Por força das imposições ambientais europeias, a produção dos novos comerciais ficou mais cara.
Para já, os preços de venda, pelo menos nas grandes contas, não refletem os custos na mesma proporção. Mas há outras questões subjacentes que importa desde já analisar
A venda de comerciais na Europa cresceu 11,6% em 2016 e quase atingiu os dois milhões de unidades ligeiras no final deste ano, sendo que, em 2015, esse valor foi de cerca de 1,7 milhões de veículos.
Maioritariamente movido a gasóleo (outros combustíveis e a energia elétrica ainda não têm peso significativo), o mercado de viaturas profissionais conviveu, em 2016, com dois fatores relacionados entre si: por um lado, a repisada questão da discrepância das emissões fez aumentar a pressão sobre o gasóleo e, consequentemente, as preocupações dos principais construtores de motores, por outro, a entrada em vigor da norma Euro6 nos comerciais, naturalmente mais rigorosa em termos ambientais.
Para estarem em condições de cumprir as novas exigências, os construtores automóveis foram obrigados a integrar complexos sistemas de controlo de mistura (combustível/ar e, em alguns casos, ureia) e também de tratamento de gases de escape que, em média, podem encarecer em cerca de 1300 euros o preço final por unidade.
A fonte é um relatório da “Exane BNP Paribas” citado pelo Financial Times, que prevê ainda um acréscimo de 200 a 300 euros para a conformidade com a norma Euro6c, prevista para vigorar a partir de 2017, altura em que se inicia um novo regime de aferição de consumos e emissões em condições reais de utilização do veículo.
Como uma e outra coisa se relacionam é o que vamos perceber já a seguir.
Antecipação de vendas
Quando se olha para o mapa de vendas automóveis europeu, constata-se que o mês de Agosto de 2016 correspondeu a um mês extraordinariamente forte na procura de comerciais ligeiros, quase 36% mais do que em idêntico período de 2015.
A razão que justificou este crescimento, num mês por tradição mais calmo no que se refere ao mercado automóvel, foi o facto de, a partir de 1 de Setembro, entrar oficialmente em vigor a norma de emissões Euro 6 para esta classe de veículos.
O que naturalmente levou alguns construtores a anteciparem vendas ou a matricularem versões ainda com motores da geração Euro5, apesar de um período de derrogação que prevê, em função das vendas passadas, a comercialização de um número limitado de unidades Euro5 além desta data.
E é aqui que surgem as boas e as más notícias.
A boa é que os modelos Euro6 dispõem necessariamente de motores mais eficientes, o que significa consumos e emissões mais reduzidos.
Mas será que isto pode ser representar custos de utilização efetivamente mais baixos? E esta é a parte menos positiva de uma realidade que levou até alguns fabricantes a anteciparem o lançamento de novos comerciais, de forma a poderem incluir ainda motores da geração anterior.
Quanto custa o Euro6?
Comparado com o anterior Euro5, preocupado em grande parte com as emissões de dióxido de carbono (CO2), o Euro6 acrescenta como grandes alvos o óxido de azoto (NOx), o dióxido de enxofre, o monóxido de carbono, hidrocarbonetos e outras partículas nocivas que são libertadas pela queima do gasóleo.
Além, naturalmente, do CO2.
Esta tecnologia adicional de retenção de poluentes é naturalmente mais dispendiosa, devido até à necessidade de utilização, no caso dos filtros de partículas, de metais nobres.
Como ela é substancialmente mais cara, na teoria, isso deveria originar preços de aquisição mais elevados, de forma a manter a rentabilidade dos fabricantes.
Para atenuar parte desses custos, uma das formas é a produção comum de um mesmo veículo, que depois é comercializado por marcas concorrentes.
E após a aquisição do veículo?
Apesar de alguns novos modelos reclamarem intervalos de manutenção mais alargados, é preciso somar uma despesa adicional, o abastecimento do depósito da solução vulgarmente conhecida como Adblue, quando esta necessidade está presente no sistema.
Há ainda que ter em conta a eventualidade de custos mais elevados em caso de sinistros que afetem esta parte do motor, ou até de avaria do equipamento fora do período da garantia.
Para se ter uma ideia dos valores envolvidos, ainda no sistema Euro5, o preço de um filtro de partículas é cerca de 1.500 euros, mais despesas de oficina.
Já a substituição de uma linha completa de escape pode importar vários milhares de euros.
Não esquecendo que o tempo de vida útil de um filtro de partículas varia entre 120 mil a 150 mil quilómetros, além dos custos adicionais com a sua limpeza, caso fique obstruído por não ter sido efetuado a correta regeneração passiva indicada pelo fabricante.
Custos de terminação também podem subir
Adicionalmente, outras razões podem vir a encarecer os custos de operação destes veículos.
Porque longe vão os tempos em que os comerciais eram “puros e duros” carros de trabalho, em que a força e a capacidade de carga eram a razão principal da escolha.
Atualmente, os furgões de transporte de mercadorias estão obrigados a cumprir um conjunto de requisitos de segurança, passiva e ativa, dispondo ainda de raiz de um conjunto de ajudas eletrónicas à condução, além de tecnologia de navegação e de conetividade.
Estes sistemas, úteis à condução ou à tarefa de controlo de frota, são também os mais sujeitos a avarias, decorrentes ou não da sua (má) utilização, com elevado risco de poderem gerar implicações sobre outros dispositivos do veículo.
E sendo o ciclo de vida destes veículos geralmente longo, qual o grau de fiabilidade destes sistemas e os custos de reparação ou de substituição de componentes, após ultrapassado o período da garantia do fabricante?
A soma de todos estes fatores poderá resultar em custos de terminação mais elevados para as empresas ou até uma inesperada redução dos valores residuais destas viaturas no final dos contratos.
E o mercado de usados? Como vai reagir?
Por fim, alguns analistas do setor automóvel mostram preocupações quanto ao que poderá acontecer daqui a 3, 4 ou 5 anos, quando estas unidades Euro6 regressarem ao mercado como veículos usados, tendo como destino habitual empresas ou empresários com menores recursos.
Como se perspetiva que, até lá, os centros de inspeção obrigatórios de veículos venham a ser dotados de melhores condições técnicas, o que lhes vai permitir examinar eventuais alterações na cadeia de combustão e aferir a emissão de outros poluentes além do CO2, mais difícil vai ser efetuar qualquer modificação com o objetivo de reduzir custos e tornar mais competitiva a oferta comercial.
E se gestoras e marcas já se debatem atualmente com a redução dos canais de escoamento de usados que utilizavam anteriormente, nomeadamente países com menores recursos, o que fazer então com viaturas tecnicamente mais complexas?
Portugal e o Euro6. O que dizem os importadores nacionais?
Uma ronda pelas marcas líderes deste mercado e algumas gestoras revelou uma visão mais otimista no que se refere aos custos de operação e algumas grandes empresas, que renovaram frotas em 2016, com uma e outra tipologia de motores, indicaram que as variações de negociação raras vezes ultrapassaram os 10%, face aos valores obtidos nos primeiros meses do ano.
No geral, os custos de aquisição foram justificados com acréscimo de equipamento, sendo que a algumas propostas a que a FLEET MAGAZINE teve acesso mostraram também um crescimento pouco significativo dos custos de manutenção das unidades mais recentes.
Perguntas importantes sobre o Euro6 com respostas rápidas
Existem formas diferentes de cumprir o Euro6?
Sim. Dependendo do tipo de motor e da capacidade do veículo, comerciais mais pequenos poderão ter apenas necessidade de sistemas de retenção de NOx mais simples, utilizando, por exemplo, a recirculação dos gases (com aproveitamento de válvulas EGR).
Embora o mesmo motor possa também vir a ter necessidade de acrescentar tecnologia SCR (Redução Catalítica Seletiva), com injeção de AdBlue, quando utilizado em versões com maior capacidade de carga.
O que é o AdBlue?
É o nome pelo qual é conhecida uma solução aquosa de ureia, transportada num reservatório adicional, um agente há muitos anos utilizado para decompor o NOx em vapor de água e azoto. Não é o que mais encarece os custos de operação mas, como se trata de um depósito adicional, pode reduzir a capacidade de carga útil do veículo.
Que vantagens o Euro6 traz para o consumidor?
Sem esquecer a importante questão do ambiente, a mudança para Euro 6 aumenta, em teoria, a eficiência do motor: geralmente tem mais potência mas consome menos e, muito importante, apresenta emissões mais baixas, com vantagens fiscais e para a pegada de ambiental das empresas.
Há ainda cidades com zonas delimitadas que só permitem a entrada de veículos mais recentes.
Todos os veículos vendidos após 1 de setembro de 2016 são Euro6?
Não necessariamente. Alguns fabricantes beneficiaram de um período especial que lhes permite vender um número limitado de unidades, que é calculado em função do volume das vendas de anos anteriores.